sábado, 28 de março de 2009

60 anos da primeira ligação

Fez esta semana, do dia 25, sessenta anos sobre o dia em que o sonho ganhou asas.
A estrela deste passo de gigante chamava-se G-AGEU, pertencia à companhia britânica "Aquila Airways", que fazia as ligações aéreas entre Southampton, Lisboa e Madeira e seduziu os madeirenses no final da década de 40.
Contam os jornais da época que nos dias anteriores chovera a potes fora da cidade e que o Funchal fora poupado à intempérie. O redactor do artigo do Jornal, publicado a 27 de Março, contava que horas antes do "pássaro de ferro" aparecer na Ponta do Garajau, havia literalmente milhares de pessoas à espera do momento que o relógio da Catedral testemunhou como sendo 12h54.
O "G-AGEU" passou sobre as embarcações que o aguardavam em frente ao Forte de São Tiago e depois voou para Oeste e tomou o rumo sul. Passou novamente sobre os barcos e rumou para sul, para então dar a volta.
O "Short" fez, então, a aproximação, tendo tocado as águas da Madeira por volta das 13 horas, desligando dois dos motores e amarisado apenas com dois, tendo concluído a manobra às 13h15, hora a que ficou estabilizado no molhe da Pontinha.
Um "magnífico aparelho de construção moderna", lia-se no jornal, que chegou com 22 passageiros, que demoraram "apenas" 4 horas e 20 minutos entre Cabo Ruivo, no Tejo, Lisboa e a baía do Funchal, na Madeira.
Durante a viagem, o Posto Rádio Naval do Pico esteve em contacto permanente com o aparelho, com as condições de tempo fornecidas de meia em meia hora pelo Observatório de Meteorologia do Funchal.
A bordo de uma lancha dos "Socorros a Náufragos" , de nome "Celestino da Silva", estava o Comandante Inocêncio Camacho de Freitas, Capitão do porto do Funchal, que dirigiu a manobra de amarisagem, tendo ficado em Lisboa várias entidades oficiais, nomeadamente o governador, Lobo da Costa.
A grande novidade não era apenas a maior mobilidade dos passageiros, era também a maior rapidez com que se escoava a correspondência de e para o resto do mundo, porque o "G-AGEU" trouxe e levou mala postal quando levantou voo, dois dias depois.
Fez ontem sessenta anos que o "Aquila" saiu em direcção a Lisboa, mas não foi a primeira vez que a barriga de um hidroavião tocava as águas da baía do Funchal. Em 22 de Março de 1921 já três oficiais de Marinha o tinham feito, com sucesso, dois deles ainda vivos em 1949 e sem direito a convite para testemunhar o momento que se vivia. Gago Coutinho e Ortins de Bettencourt. Sacadura Cabral, entretanto desaparecido, fizera com o primeiro o voo de ligação ao Brasil, enquanto Bettencourt ficara na ilha. Esse voo no "Felixtowe F3" trazia ainda o mecânico francês Roger Soubiran.
O tempo evoluiu e 51 anos depois, houve ainda mais pompa e circunstância no momento de inaugurar o Aeroporto Internacional da Madeira. Com direito a presidente da República, Primeiro-ministro e até mesmo a Comissário Europeu. Já não era tempo de amarisar, mas continuava a ser tempo de sonhar. Mas, sobretudo, de tornar os sonhos realidade.
Desde 1960 que se "aterra" na Região, primeiro no Porto Santo, de onde os "ferries" Lisbonense e Cedros saíam para o Funchal. E desde 1964 que se usa a pista do Aeroporto da Madeira, anteriormente baptizado de "Santa Catarina". A moldura humana que ficava na retina dos que viviam a chegada e a saida do "Aquila" desapareceu, mas as memórias não desaparecem com o tempo. Nem a história...

in Jornal da Madeira (Cristina Costa e Silva)

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